terça-feira, 13 de abril de 2010

Análise Castração Química

Introdução:

O presente trabalho tem por finalidade responder a solicitação da disciplina de Direito Penal II, especificamente no que versa ao tema da castração química, como projeto de lei para crimes de pedofilia no Ordenamento Jurídico Brasileiro.
Realizar-se-a uma explicativa a respeito dos conceitos de castração química e pedofilia para que, então, se possa fazer uma análise dos mesmos enfocando o Direito Penal, a Constituição Federal e outros aspectos relevantes à aplicabilidade da castração química como forma de justiça. Esta analise englobará, também os aspectos psicológicos e sociológicos desta forma de punição para que se possa ampliar a visão jurídica do tema proposto.


Castração Química:

Castração química é a administração de medicamentos com a finalidade de reduzir a libido e a atividade sexual, usualmente na tentativa de prevenir a repetição de crimes sexuais, especialmente contra crianças. Diferente da castração cirúrgica, onde os ductos do esperma são seccionados através de procedimento cirúrgico no escroto. Castração química não castra, nem esteriliza a pessoa, ela apenas reduz temporariamente a libido tornando a pessoa “incapaz” de sentir atração sexual.
A castração química é, geralmente considerada reversível quando da interrupção da medicação, não ocorrendo, até o presente momento mudanças físicas e ou psicológicas nos sujeitos que se submeteram ao tratamento.
O tratamento na castração química se da na forma de administração através de injeção de medicamentos tais como, Cyproterone e Depo-Provera e que tem duração de três meses por dose.
Testes realizados em 1891, em 48 homens condenados por crimes sexuais apresentaram resultados melhoramentos no comportamento sexual e diminuição de comportamento desviante de cunho sexual.
Alguns países como Polônia, Alemanha e alguns estados dos EUA já realizam tratamentos de castração química em condenados por crimes sexuais, porém ainda é vaga a resposta de efetivos resultados a respeito do tratamento como eficácia na diminuição de tais crimes.


Pedofilia:

Pedofilia é o desvio sexual "caracterizado pela atração por crianças, com os quais os portadores dão vazão ao erotismo pela prática de obscenidades ou de atos libidinosos” (Croce, 1995).
A pedofilia é um transtorno de personalidade da preferência sexual que se caracteriza pela escolha sexual por crianças, quer se tratem de meninos, meninas ou de crianças de um ou do outro sexo, geralmente pré-púberes ou no início da puberdade, de acordo com a definição da CID-10 - Classificação Estatística Internacional de Doenças e Problemas Relacionados à Saúde. Ainda de acordo com o DSM-IV, o transtorno de pedofilia começa, geralmente, na adolescência, embora alguns indivíduos portadores relatem não ter sentido atração por criança até a meia-idade. A freqüência do comportamento pedófilo costuma flutuar de acordo com o estresse psicossocial e seu curso é crônico, especialmente nos indivíduos atraídos por meninos. A taxa de recidiva para portadores do transtorno de pedofilia que preferem o sexo masculino é, aproximadamente, o dobro daquela observada nos que preferem o sexo feminino.
Nessas classificações, a pedofilia está agrupada a transtornos que fazem parte do grupo das chamadas parafilias, que são caracterizadas por anseios, fantasias ou comportamentos sexuais recorrentes e intensos que envolvem objetos, atividades ou situações incomuns e causam sofrimento clinicamente significativo ou prejuízo no funcionamento social ou ocupacional e em outras áreas importantes da vida do indivíduo e ou de suas vítimas.
Quem é o pedófilo? Os pedófilos têm as crianças como objeto do desejo, fonte de prazeres sexuais. O pedófilo pode ser o professor, o animador de festas, o técnico de futebol, o médico ou qualquer outra pessoa que tem fácil e justificado acesso ao universo infantil. Os pedófilos, muitas vezes, nem têm contato genital. Eles fotografam, se excitam com a situação, podem limitar-se a despir e observar a criança; exibir-se, masturbar-se na presença dela ou afagá-la. O indivíduo classificado como pedófilo deve ter, no mínimo, 16 anos de idade, o diagnóstico não se aplica quando se trata de um indivíduo no final da adolescência envolvido num relacionamento sexual contínuo com alguém de 12 ou 13 anos. Na classificação por sexo, 98% dos pedófilos são homens e somente 2% são do sexo feminino. Outro dado divulgado é que 95% dos pedófilos são heterossexuais.

O Direito e a Pedofilia:
Pedofilia não é crime, ao menos não existe previsão legal disposta no Código Penal Brasileiro ou em qualquer outro código brasileiro sobre o tema.
A pedofilia é um termo de origem grega que se refere aos que gostam de crianças, ou amam crianças, sendo assim o termo, muitas vezes usado erroneamente por leigos, leva a crer que pedofilia é um crime previsto no ordenamento jurídico brasileiro. O termo pedofilia começou a ser relacionado com crimes devido a nomenclaturas usadas por psicólogos o psiquiatras para categorizar e conceituar comportamentos sexuais desviantes, o que levou a sociedade a introduzir nos seus costumes a classificação de pedofilia como crime.
As previsões legais do Código Penal e do Estatuto da Criança e do Adolescente é quem podem esclarecer como deve ser feita a imputação de crime sexual contra menor (criança). Vejamos a seguir:
"Art. 213Código Penal - Constranger mulher à conjunção carnal, mediante violência ou grave ameaça. Pena - reclusão, de 6 (seis) a 10 (dez) anos".
Quando o estupro tem como sujeito passivo um menor de 14 (quatorze) anos, o Código Penal dispõe que a violência exigida pelo tipo, elemento essencial à sua configuração, se encontra presumida pela lei. Em outras palavras, o simples fato de manter relações sexuais com menores de 14 (quatorze) anos é suficiente para consumar o estupro, ainda que tenha havido consentimento da vítima. ( LAURIA Thiago, 2009).
"Art. 214 Código Penal - Constranger alguém, mediante violência ou grave ameaça, a praticar ou permitir que com ele se pratique ato libidinoso diverso da conjunção carnal. Pena - reclusão, de 6 (seis) a 10 (dez) anos".
O tipo penal transcrito abrange toda e qualquer forma de violência sexual, que não o estupro. Assim, atos como a cópula anal, o sexo oral, o apalpar de seios ou genitálias, por exemplo, se realizados sem o consentimento da vítima, e com o uso de violência ou grave ameaça, serão considerados como atentado violento ao pudor. (LAURIA Thiago , 2009).
"Art. 233 CódigoPenal - Praticar ato obsceno em lugar público, ou aberto ou exposto ao público. Pena - detenção, de 3 (três) meses a 1 (um) ano, ou multa".
No caso de ato obsceno praticado usando de menores, o delito se configura da mesma forma, relevando-se ainda que os delitos praticados via Internet e televisão envolvendo menores podem ser enquadrados no art.233, todavia, se o delito for cometido contra crianças, aplicável será a agravante genérica do art. 61, II, h do Código Penal, que deverá ser levada em conta pelo juiz quando da fixação da pena.
"Art. 218 Código Penal - Corromper ou facilitar a corrupção de pessoa maior de 14 (catorze) e menor de 18 (dezoito) anos, com ela praticando ato de libidinagem, ou induzindo-a a praticá-lo ou presenciá-lo. Pena - reclusão, de 1 (um) a 4 (quatro) anos.
"Art. 240 Estatuto da Criança e do Adolescente. Produzir ou dirigir representação teatral, televisiva, cinematográfica, atividade fotográfica ou de qualquer outro meio visual, utilizando-se de criança ou adolescente em cena pornográfica, de sexo explícito ou vexatória. Pena - reclusão, de 2 (dois) a 6 (seis) anos, e multa".
"Art. 241 Estatuto da Criança e do Adolescente. Apresentar, produzir, vender, fornecer, divulgar ou publicar, por qualquer meio de comunicação, inclusive rede mundial de computadores ou internet, fotografias ou imagens com pornografia ou cenas de sexo explícito envolvendo criança ou adolescente. Pena - reclusão de 2 (dois) a 6 (seis) anos, e multa".
Aquele que produz material obsceno ou pornográfico envolvendo crianças e adolescentes estará incidindo nos arts. 240 e 241 do ECA, sendo passível de responder por crimes referentes a estes artigos.
Pesquisas demonstram que a maioria dos casos de violência sexual contra menores são cometidos por pessoas normais, e não por pedófilos. Mais que isso, menos que 1% dos pedófilos, diagnosticados como tais, chegam a abusar sexualmente de crianças. (ALMEIDA, Marco Aurélio, Boletim IBCCRIM, 2005).
Agora que se sabe que pedofilia não é crime, e sim um termo médico usado para designar determinado comportamento sexual e que a maioria dos crimes praticados contra menor não esta diretamente relacionado a pedófilos e que as disposições legais não mencionam tal termo como podemos caracterizar o pedófilo como criminoso?


O Direito e a Castração Química:

O Senado Federal apresentou, através de um de seus representantes o “Projeto de Lei 552/2007” que visa incluir no ordenamento jurídico a castração química.
Este projeto tem como objetivo punir condenados por crimes sexuais contra crianças e adolescentes, não mais com pena de reclusão, e sim com uma pena “química”, isto é, punir os criminosos deste tipo de crime com drogas que os impossibilitem de exercer suas funções sexuais de maneira plena.
Em primeira vista, o projeto de lei nos salta aos olhos como uma solução a tal crime, porém tal medida fere gravemente princípios do nosso ordenamento jurídico, tais como: dignidade da pessoa humana, humanidade, igualdade social, dentre outros. Se fere, então para que se possa aplicar tal condenação deve-se reformular também o ordenamento jurídico brasileiro, o que seria uma medida descabida. A idéia de reformulação do ordenamento jurídico, por mais absurda que pareça, necessariamente teria de ser feita, pois, se não ocorresse, milhares de outras soluções alternativas poderiam ser propostas para crimes que nos pareçam repugnantes. Pode-se estabelecer lobotomia para homicidas violentos, cisão de nervos sub-linguais para estelionatários, e tantas outras formas-solução imediatas para os mais variados crimes.
O ponto principal desta discussão, porém não gira em torno do projeto de lei, mas sim do Direito, como ente capaz de trazer segurança e coesão social a população. Estes projetos absurdos só surgem devido à incapacidade do Direito de exercer de forma plena o que nele já é previsto como lei.


Considerações Jurídicas, Sociológicas e Psicológicas:

O tema da castração química, proposto neste trabalho deve ser visto tanto a luz do direito como a luz de outras ciências, pois envolve, não só o comprometimento do ordenamento jurídico, mas o comprometimento da segurança social e psíquica da sociedade.
Se tal lei for aprovada teremos rompido com o pacto social estabelecido, tornando o Estado um ente criador de novas punições. E este fato gerará na população a insegurança de que se o Estado pode punir da forma que lhe convier sem respeitar princípios duramente conquistados ao longo da história do Brasil. Com isso nunca saberemos exatamente quais as conseqüências de se praticar um crime, isto é, hoje poderá ser pena de reclusão, amanhã de amputação.
Deve se levar em conta, também que uma população insegura é uma população psicologicamente instável, e este fator só gera mais crime, com isso tem-se um Estado instável, uma sociedade instável e uma população instável. É uma receita para o desastre.







Conclusão:

Mudar as formas de punir os criminosos não trará nenhum benefício à sociedade, tanto é verdade que se olharmos ao longo da história veremos que milhares de formas de punição foram criadas e extintas e o comportamento humano relacionado a pratica de delitos nunca mudou.
O Estado pune o fato, mas quem responde é quem praticou, fato delituoso praticado, condenação imposta. Mas se o Estado tem o poder/dever de condenar, tem também o poder/dever de ressocializar. O Direito Penal brasileiro tem em suas previsões legais tanto a capacidade de condenar como a de ressocializar, porém a prática demonstra a pouca eficiência do Estado nos dois quesitos.
O Estado esta pouco apto, ou pouco aparatado para exercer a função de condenação e ressocialização, e os motivos desta inépcia são os mais variados.
Tem de se ter em mente que um Estado forte não é aquele com capacidade de punir e sim de erigir bases sólidas para minimizar as mazelas sociais, mazelas estas que não são só os crimes, mas tantas outras coisas que perturbam a harmonia social.
A atitude do Estado ainda está quase totalmente focada em reparar os efeitos, deixa muito a desejar em relação ao comprometimento com as causas.
Olhar as causas entendê-las e tratá-las, por mais dispendioso que seja para um Estado, é a maneira mais eficaz de se solucionar os problemas sociais com os quais o próprio Estado tem de lidar. E mesmo que em um primeiro momento seja economicamente mais caro, os efeitos a médio e longo prazo serão muito mais benéficos tanto para população como para o Estado.
Criar novas leis é completamente desnecessário, nosso ordenamento jurídico já possui leis mais que suficientes para que o Estado e a sociedade estejam amparados, sendo assim, projetos como o da castração química são inúteis, ineficazes e perturbadores para o Direito e para o Estado.



Referências Bibliográficas:

ALMEIDA, Marco Aurélio, Boletim IBCCRIM, 2005

BREIER, Ricardo e TRINDADE, Jorge Pedofilia - Aspectos Psicológicos e Penais, Ed: Livraria do Advogado, 2008

CAETANO, Dorgival, Cid 10 Classificação de Transtornos Mentais de Comportamento e Diretrizes Diagnósticas, 2008

CROCE, Delton, , Manual de Medicina Legal, Ed. Saraiva, 1995

JORGE, R Miguel, DSM-IV Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais, 2007

LAURIA, Thiago. Pedofilia é Crime?, 2009. Disponível em: http://www.jurisway.org.br/v2/cursosentrar.asp?id_curso=502. acesso em 03 de abril de 2010.

NUCCI, Guilherme de Souza, Código Penal Comentado, Ed. RT, 2009

MAGNO FERNANDES M. AGUIAR, Alexandre. O "direito" do condenado à castração química, 2007. Disponível em: http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=10613, acesso em 03 de abril de 2010.

WUNDELIICH, Alberto, Pense na castração química como punição para crime sexual, 2007, Disponível em: http://www.conjur.com.br/2007-mar-10/pense_castracao_quimica_punicao_crime_sexual, acesso em 03 de abril de 2010.

Um comentário:

Murilo Jorge disse...

Bruno,
Parabéns pelo trabalho.
Pesquisando os trabalhos na internet, me assustei quando encontrei este.
Foi um alívio identificar o blog como seu!
Um abraço,

Murilo Jorge